Lá estava a mulher, em plena maturidade dos seus trinta e poucos anos, bonita ainda, esteticamente falando, mas esquecida pelo mundo.
Apesar das poucas conquistas, no decorrer de sua vida, conseguiu formar uma família e obter casa, carro, enfim, aquilo com o qual a maioria das pessoas intentam para o resto de suas vãs existências.
No entanto, as lembranças a perseguiam e faziam-na pisar e cortar a pele dos pés, como se fossem cacos de vidro quebrados ao chão que sangrava incessantemente e chegava até o coração.
Ela encharcava os olhos verdes embargados pela dor mensurado ao imenso oceano da saudades.
Pensava o quão tolas eram as pessoas; porque no momento daqueles sonhos pré adolescentes queriam tanto ter uma vida plena em família, com uma casa e um belo carro na garagem e daí pronto, tudo seria perfeito.
Mas a verdade é que não sabiam de nada, nada era de fato daquele jeito.
As coisas, pessoas, tudo aquilo, ora sonhado no passado não passava de mera ilusão.
Mas a verdade é que não sabiam de nada, nada era de fato daquele jeito.
As coisas, pessoas, tudo aquilo, ora sonhado no passado não passava de mera ilusão.
Felicidade utópica e temporal, sentimentos criados em laboratório pelo homem pós moderno e só.
E esta mulher? Oras, não passava disto mesmo...criação de laboratório. Sua vida era uma farsa!
Continuou dirigindo numa velocidade morosa, haja vista o trânsito intenso, ponto marcante das grandes cidades como São Paulo.
Acendeu o cigarro e manteve os vidros fechados, mesmo sentindo-se sufocada pela fumaça aguentou firme a poluição interna que ela própria provocara por conta do medo da violência, espalhada pelas ruas e avenidas urbanas.
Enquanto ouvia a bela composição clássica russa de Rachimanivov, percebera que precisava de algo a mais naquela tarde de tempo abafado e cinzento e que não somente sua rotina doméstica preencheria. Algo especial que abraçasse sua alma e levasse sua dor...então o farol abriu e o trânsito fluiu lentamente.
Sem direção certa, deixou-se levar e repentinamente, tomou um outro rumo a caminho de algum alento ou resposta.
Voltou no ventre de suas memórias, suas lembranças: pegou-se parada de fronte àquela praça, não qualquer praça, mas aquela que fez parte de sua adolescência.
Olhou em volta, dirigiu para um local mais próximo, mas não tomou coragem de sair do veículo.
Abriu o vidro e fixou o olhar naquele local tão cheio de amor, tristeza, alegria e muita, muita saudades.
Abriu o vidro e fixou o olhar naquele local tão cheio de amor, tristeza, alegria e muita, muita saudades.
Percebera quão arborizada estava e em seu seio adornos bem pintados e cuidados de uso infantil, uma grande pista de skate e o palco do Morcegão...puxou de suas lembranças os shows de bandas de garagem que ali se apresentaram e as noites que ficara sentada tomando vinho naqueles bancos de cimento periféricos.
O adeus, o retorno, o barulho do carro antigo, a música clássica, o cheiro de perfume importado misturado à naftalina...onde ficara tudo? - pensava.
Quando caiu em si, lembrou-se do horário, abriu os olhos da percepção e acelerou seu belo carro, aliás, mais uma de suas conquistas, pensando o quanto fora feliz com tão pouco e o quanto hoje era infeliz com tudo aquilo que conquistou.
Queria aquele pouco de volta. Trocaria tudo pelo nada do passado: coisas e pessoas que se foram.
Mas sabia que não podia, então chorou, chorou e gritou por dentro agudamente, deixando ecoar, junto ao som da canção.
Era o embate do tudo e do nada.
Perguntava-se reflexivamente o que afinal era tudo e o que era nada, já que pra ela o nada seria tudo?
Perguntava-se reflexivamente o que afinal era tudo e o que era nada, já que pra ela o nada seria tudo?
A verdade é que a mulher perdera nada e ao contrário, ganhou quase tudo o que quisera no passado.
Mas percebera que deixou escapar no tempo, fagulhas de ilusões, e pessoas, coisas inestimáveis que se foram e não mais poderiam voltar, nunca mais!
Onde foram? Ficaram ali, invisíveis, na praça do Morcegão.
(Pour Anna)
Reflexão: trecho de um conto escrito por mim na tarde da última sexta-feira de fevereiro de 2014 em meio a um ataque saudosista.
Local da foto é a própria praça do Morcegão que fica na zona leste, periferia de SP, local onde vivi minha infância e adolescência e que tenho grande amor e apego.
(Pour Anna)
Reflexão: trecho de um conto escrito por mim na tarde da última sexta-feira de fevereiro de 2014 em meio a um ataque saudosista.
Local da foto é a própria praça do Morcegão que fica na zona leste, periferia de SP, local onde vivi minha infância e adolescência e que tenho grande amor e apego.
Muitas saudades...
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